Title: Quanto basta a respeito do dia 25 de abril de 1828
Author: Manuel Cipriano da Costa
Release date: November 12, 2010 [eBook #34291]
Most recently updated: January 7, 2021
Language: Portuguese
Credits: Produced by Mike Silva
QUANTO BASTA
A RESPEITO
DO
DIA 25 DE ABRIL DE 1828.
LISBOA:
NA REGIA TYPOGRAFIA SILVIANA.
ANNO DE 1829.
Com Licença da Meza do Desembargo do Paço.
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QUANTO BASTA A RESPEITO
DO
DIA 25 DE ABRIL DE 1828.
Não he possivel sofrer por mais tempo as injurias, e despreso com que os suspeitissimos na Sagrada Causa da Legitimidade d'EL-REY Nosso Senhor tem tratado o maravilhoso passo, dado no Memoravel Dia 25 de Abril de 1828 para a Sua Feliz Acclamação; e não será necessario, que a penna cance quando della partem facilmente os bastantes rasgos para destruir a máscara da prudencia, que não deixava apparecer semblantes atraiçoados.
Ou o Facto do Dia 25 he irregular, e abominavel nos seus Effeitos; ou elle tem Modelos em a nossa Historia, e he respeitavel pela sua Consequencia. O Facto he irregular, mas tem Modelos em 1139 por Affonso I., em 1385 por João I., e em 1640 por João IV. Não he abominavel, antes abençoado nos seus Effeitos, e respeitavel na sua Consequencia: Logo, o Facto{4} he digno de louvor, e hum documento para a Historia Patria, que deixará eterna a memoria da mais deliberada Lealdade de huma tão benemerita Capital.
Não he novo, que homens depravados appelidem por indignidade o mais Heiroco Feito. Lord Lundsdown, discipulo de Canning, atreveo-se publicamente a comparar a Restauração de Portugal com a emancipação das Americas rebeldes, tendo por Agentes Bolivar, e Victoria.
O Senhor D. Affonso I., o Senhor D. João I., e o Senhor D. João IV. forão Acclamados antes da reunião dos Estados. Os Fidalgos então o fizerão, por que o quizerão; mas por que huma parte delles agora o não quiz, deve condemnar-se o que se fez? Então combinárão-se a sustentar os Seus Novos, e Preciosos Soberanos: hoje fogem, e atacão os mesmos principios que então vigorárão; e he isto boa fé?
Dizem as Côrtes, convocadas pelo Senhor D. João IV., que só nellas reside o poder de Julgar a quem a Coroa pertence de direito, todas as vezes, que se suscita duvida entre os Pertendentes: Mas! Lisboa não vio, que o Senhor D. MIGUEL pertendesse a Coroa: vio, que, possuido de huma nunca vista Modestia,{5} recebia as Supplicas, e Autos dos Povos, e não Havia por bem Deliberar-Se. Neste caso o grito de Lisboa obriga a Representar; a Representação obriga a Decidir; a Decisão obriga a Convocação dos Braços, e os Braços obrigão a aceitar a Coroa. Effeitos daquella Causa, e que sendo bons, Sanctificão o seu Principio. E que houve neste Principio? Petição, e não Acclamação: tranquillidade, e regosijo publico. Que houve nos Seculos XIV., e XVII.? mortes no Palacio, mortes nas ruas, hum Arcebispo da Torre abaixo, Acclamação em todo o caso, &c. e tudo valeo!!
Se se dá questão na Legitimidade, quem tinha a parte duvidosa ainda hoje não se dá por vencido; mas, os que não a tinhão não precisavão Conselho: e quem será mais em direito, os Procuradores, ou os Constituintes? Os Constituintes fallárão, e escrevêrão. (Veja-se o que proclamárão os Póvos, e o que escrevêrão os dignos Tribunaes, e todas as Classes) Também depois fallárão, e escrevêrão os Procuradores: melhor he, que todos fallassem, e escrevessem, por que he duplicar o que já estava expressado destinctamente; mas não he fazer mais valido o Procurador, que o Constituinte. A incomparavel Obra = D. MIGUEL{6} PRIMEIRO = a pag. 51 diz «Ha em Portugal duas fórmas, igualmente legaes, de reconhecer os Soberanos: por Acclamação, e Proclamação, ou em Côrtes.» e quem deixa de respeitar esta insigne Obra? O zeloso, e circunspecto Intendente Geral da Policia até repartio os seus Exemplares.
Como se ha de exprimir o Povo? será nos Clubs secretos da Maçonaria, ou no Campo, como em momentos semelhantes, (e só em taes momentos licito) a respeito do 1.º Affonso, e do 1.º, e 4.° João? Aquella mesma inimitavel Obra conclue «As Côrtes, por tanto, legitimamente convocadas pelo Senhor D. MIGUEL PRIMEIRO, e a rogos da Nação, exprimida nas Representações das Camaras Municipaes do Reino, e dos Corpos do Estado, decidirão &c.» Note-se: Os Corpos do Estado, ainda que desejavão fallar, sómente fallárão depois do Senado de Lisboa: as outras Camaras, fallárão pelo grito publico dos Povos: O Senado veio a representar por effeito de igual grito de Lealdade no Memoravel Dia 25 de Abril: Logo; se o Facto honroso deste Dia decidio o Senado de Lisboa; se este foi o que entrou a EL-REY, a que se seguirão nos dias immediatos aquelles dignos Corpos do Estado, e se a estes rogos he{6} que forão convocadas as Côrtes; não póde deixar de ter decorosa primasia huma Causa de que partirão taes Effeitos, e Effeitos, que pela sua dependencia bem provão a necessidade da sua Causa. Ou (por outro modo) Lisboa em silencio, o Senado mudo: mudo o Senado de Lisboa, guardadas as Representações das outras Camaras: nada por tanto de Representações dos Corpos do Estado; nada de Convocação de Côrtes, e por consequencia nada de Acclamação.... e os Tribunaes trabalhando, involuntariamente, debaixo do Titulo de hum Rey, que a Nação em geral não admittia. Que anarchicas consequencias!! que anomalias!!
Portanto:
Ou se inveja a Causa, ou se aborrecem os effeitos; e he de hum destes Sentimentos, que só parte a desapprovação de Actos, que fizerão vulto, e muito excedèrão, nos Seculos 12, 14, e 17, e o ficárão sempre fazendo, como este deve fazer na Historia do nosso Paiz.
Manoel Cypriano da Costa.